Friday, November 03, 2006

"o assobio que move o meu pé"

Mais uma pequena narrativa que escrevi, desta vez dei-lhe o titulo de:


"o assobio que move o meu pé"

... Sinto-me desconfortável no topo desta montanha. Sinto-me usado! Sinto as asas partidas, destorcidas, atrofiadas de tantos encontrões e empurrões. Não me sinto capaz de voar, sinto um medo estranho da terra. Curioso... para quem aprendeu a voar desde cedo, já lá vão 34 anos, realmente é estranho esta forma de estar. Não tenho bússola, mas posso dizer com uma angústia tremenda que me aperta o coração que... que... enfim, que tenho um mau sentido de orientação, nem com uma simples rosa-dos-ventos na mão encontro o caminho. Sou um carteiro, um mero moço de entregas. Daqui de cima olho este infinito labirinto, uma repleta floresta de cimento que perco no horizonte e pergunto-me para dentro:
“Tu acabas? Diz-me... tu acabas? Tens morada ou código postal?”
Os meus sentidos não captam nada...Alguns deles estão enferrujados!

Carrego numa das minhas mãos um embrulho, uma caixa que me foi entregue e que no entanto me faz sentir estranho por dentro, como se tivesse um formigueiro na barriga, olho em redor da caixa desconfiado, rodo, rodo e torno a rodar, como se estivesse a completar um cubo de kubrik, olho para estas duas mãos grandes, cobertas de pó que escondem as suas cicatrizes que o tempo não poupou, “ai vida, vida a minha!”. A caixa é perfeitamente normal como qualquer outra caixa, embrulhada num papel castanho-escuro e com um cordel em seu redor, não percebo o que o selo diz, mas, o remetente é claro no que diz: “ Avenida dos Assobios 5º D “. Não faço ideia de onde seja este lugar, ou sequer se existe, e se existe como saberei que lá cheguei?

“O que é isto?” Digo eu rapidamente olhando em meu redor!
Ouço um som arcaico, um assobio...parece-me uma melodia e estranhamente reconfortante no ouvido, sinto-o como se fosse um chamamento, um encanto, como um íman aos meus sentidos. Levanto-me do chão, olho em redor e posso dizer que do topo desta montanha o som é fantástico e ecoa, recorda-me a primavera e o verão na minha infância, a voar de serra em serra, a brincar as escondias e á apanhada. Mas não consigo decifrar de onde vem esta harmonia! Ganho coragem, declino o peito para a frente, esforço as costas que lentamente abrem estas asas e solta-se um gemido da minha boca...enquanto me contorcia de dores e me questionava em relação a dor, sentia o sinal do chamamento num tom inferior ao inicial, quase inaudível, sustive a respiração, aguentei a dor por momentos e levantei voo em busca do som.
Subi as nuvens num bater de asas esforçado, o som enfraquecera, desci rapidamente das nuvens e o som estava agora mais forte, resguardei as asas, inclinei-me para baixo, estiquei o corpo, meti os braços para trás, e deixei-me ir com o vento, neste momento estava a descer a pique em direcção a terra, tal como uma bala em direcção ao seu alvo sem hesitar, sentia os olhos a lacrimejar e a escorrer em direcção a minha nuca devido a velocidade da descida.

A poucos metros do chão abro as asas e equilibro a aterragem, evito fazer qualquer ruído que seja, impossível, soltei um grito colossal de tamanha dor vinda do meu peito, deixo cair o embrulho e encolho os ombros para dentro levo os braços e as pernas ao peito e caio no chão remoendo-me. Não sei precisar quando tempo ali permaneci, uma eternidade para mim devido ao meu estado. Quando abro os meus olhos sinto uma presença mais débil do que a minha. Era um corpo velho, mal tratado pela vida também, praticamente sem penas, não conhecia tal pessoa.
O corpo aproxima-se de mim ajoelha-se a meu lado e com um gesto dócil apoia uma das suas mãos no meu ombro e com a outra acaricia-me as asas.
Nenhuma palavra saiu da minha boca, senti-me confortável o suficiente para acreditar naquele ser. Foi quando ele olha para o lado e vê aquela caixa, aquele pequeno embrulho que se encontrava a meio metro de mim dentro de uma poça de água que se havia ali criado devido ao mau tempo que se fazia sentir.
Ele com o seu braço enorme não precisou de fazer qualquer esforço para a alcançar, agarrou-a rapidamente olhando em volta com aqueles olhos enormes e rosto pálido, e depositou-a no meu colo sem hesitar.
Aquele gesto deixou-me receoso devido a estranheza da situação, entretanto ele volta a agarrar na caixa, roda-a para ver o remetente numa forma de auto confirmação e não surpreendido disse-me ao ouvido sem hesitar:

“Não te enganes, nem te deixes enganar pelas velhas sereias, musas ou ninfas.”

Olhei para ele, inclinei a cabeça para trás e franzi os olhos.
E ele continuou a falar:

“Sim, toma atenção a este vale, obedece apenas ao teu assobio, não sigas rumos desumanos, este vale não é fácil, não é nada fácil mesmo, acredita.”

Entretanto levanto-me do chão ainda com dores e interrogo-o:

“Mas de que falas tu? Quem és? Não estou a perceber!”

Ele responde:

“Xiu, cala-te! Não me interrompas para teu bem!
Mas já que perguntas, eu sou apenas mais um... enfim... sou apenas mais um que facilmente pelos sons seguiu o ritmo arrebatador, e com o bater deste meu grande pé, seguiu para o abismo da desalma, rumo à venda comercial do meu coração.
Por vezes pergunto-me: (...) O Amor vem do coração ou da cabeça? (...)
Será uma necessidade humana? Uma incapacidade? Uma fraqueza?
Uma irracionalidade de um dito animal racional? Não será o coração apenas a máquina do impulso e repulso sanguíneo para o corpo? A explosão da locomotiva estimulada pelo cérebro que obteve e reteve informações adquiridas destes meus 5 sentidos que tive em tempos? Bah!!! De que me vale a pena questionar agora?
Acho que me estou a afogar nesta circulação de tanto para dar!!!
Não acho!!! Estou mesmo!!! Onde está a máquina deste labirinto infinito, que me poderá ajudar a revitalizar e a insuflar a vida? Carente??? Sim estou, não escondo!
Vejo águias e abutres! Olho em redor e é tão barata a forma como alguns se “amam”. Não posso comprar a liberdade nem cair na tentação destes falsos slogans! Bem tento, bem tento, bem tento...será que consigo? De que me vale agora?!”


Nesta altura olho para ele e vejo lagrimas a escorrerem.
Não entendo onde ele queria chegar com aquela conversa toda.
Eu estava a tentar, juro, mas não entendia, juro que estava a fazer um esforço enorme para o perceber. Sentia-o amargurado com a vida. Porque estaria ele a ter aquela conversa comigo? Porquê? Não deve ter muitas pessoas para falar, digo eu!
Então resolvi perguntar-lhe o porquê daquela conversa, onde queria ele chegar com aquilo, ao que ele respondeu indignado com um olhar furioso:

“Não percebes? Não percebes?”

Eu disse-lhe:

“Peço desculpa mas, não percebo! Estou a tentar, mas não percebo! Desculpe.”

Então ele diz indignadamente:

“Não percebes que tudo isto é um placebo?! Não compreendes?
Que raiva que sinto! Ao tempo que me mantenho nesta sombra fugindo dos espectros! Cores! Formas! Cores! Formas! Cores! Formas! Cores! Formas! Cores! Formas! Cores! Formas! Apenas isto... são cores e formas anexadas a slogans comerciais!
Merda para as cores e para as formas, já nem isso quero, agora só quero sentimento verdadeiro de alguém! Quero cheirar, ouvir, olhar, tocar e saborear...sabes que mais? Não encontro como o que perdi em tempos neste vale... Mas esta ganância e necessidade do meu preenchimento, leva-me a limpar as lagrimas as mangas da minha pele... a mesma pele deste braço dormente que tanta força fez pelo amor”.


“Acho que já percebi onde queres chegar” – Disse-lhe eu.
Falas de Amor?... Falas de conquistas, de desesperos e enganos, de duvidas e magoas. Falas de sentimentos dispersos e turvos, de sentimentos vividos na pele, na tua pele, falas de ti!? Falas do Amor com se fosse um jogo.

“E não é um jogo? Não percebeste isso jovem?” – Disse ele.

Um silêncio caiu com esta questão, nenhum de nós falou...fiquei pensativo.
Foi então que dei por mim totalmente enroscado ao peito do pobre homem...
Ali estava eu, a soluçar palavras, a chorar baba e ranho, não me consegui controlar, recordo-me de lhe citar um poema que me ia na alma:

A receita do meu eu condicionada pelo teu
Abençoado por um coração partido que venera o meu
Um novo dia num novo espelho que me deixa reflectir
Ainda agora cheguei e já me deixaste cair

Enquanto falas olho o chão e vejo um pássaro sem asas
Adormeço num despertar amordaçado por marcas
Com esperança que um dia, no mesmo dia te encanto
Vou tentar te aquecer num lume bem brando

Louvado seja o livro de receitas que me minha mãe me deu
Um pouco de paz e amor sigo atentamente a sebenta
Não entendo, terá sido demasiada pimenta?
O tempo vai passando e fico deprimido e sozinho
Será que algum dia encontrado um abrigo?


Frio como gelo não é a minha busca. Porque resistir? Choro à lamentação. Choro! Deixei de ser homem por isso? Não!

“Como te percebo pobre rapaz... como te chamas?” – Disse-me ele.

“Peço imensa desculpa pelo acto impessoal, nem o seu nome sei.” – Disse-lhe eu afastando-me rapidamente embaraçado com a situação.

“Não faz mal... o meu nome é Marco. E o teu?” – Disse ele com um suspiro e uma mão apoiada no meu ombro.

“O meu nome é Diogo.” – Disse eu.

Senti um descontrolo emocional naqueles instantes, um sentimento de culpa enorme, isto porque olho rapidamente para o embrulho e senti o papel húmido...A morada que uma vez lá estava tinha desaparecido com tantas lágrimas derramadas.
Subitamente agarro numa caneta, e num acto de emenda tento escrever o nome no embrulho de novo. Sem resultado positivo! Esta demasiado molhado para escrever com estes hieróglifos de punho cerrado e de raciocínio rápido de memórias que parecem intermináveis. Foi então que resolvo pedir ajuda ao Marco.

“ Preciso de ajuda, não sei onde fica esta morada: Avenida dos Assobios 5º D, sabes onde fica esta morada? “ Disse-lhe eu.

“ Segue-me! “ – Disse ele.

Não voamos por muito tempo, mas o caminho foi horrivelmente ensurdecedor...
Sentia-me tentado ao que se passava lá em baixo, vacilei varia vezes aos assobios provocados por ninfas, por mulheres belas que me chamavam, senti-me como um marinheiro a deriva no mar em busca de conforto num bom porto.
Velho sábio Marco que me tapava os ouvidos e me guiava por entre a selva de pedra com palavras de animo e de aviso. Eu tinha que ser forte e resistir aquela tentação.

“ Resiste Diogo, Resiste! Força, aguenta, esta quase, já estamos a chegar! “
Dizia-me o Marco. Grade amigo que se revelou naqueles momentos.

Eu sentia o meu corpo a tremer de tanta adrenalina. Estava quase a cumprir o meu dever profissional de estafeta. Aquele embrulho tinha que ser entregue de qualquer forma ao destinatário!

“Chegamos! Estás entregue, Já fiz o meu papel!” – Disse o Marco.

“ Como te poderei agradecer pelo que fizeste por mim? “ – Disse eu.

“ Agradecer? Não! “ – Disse o Marco levantando voo rapidamente sem se despedir.




Aqui me encontro eu na “Avenida dos Assobios 5º D”, olho para o prédio entro e vou direito ao porteiro que me pergunta o que desejo, eu explico-lhe que sou um estafeta e que ia entregar em mão um embrulho ao 5º D. Ele anota o meu nome num bloco de notas e pede-me a identificação dos correios. Dada a informação burocrática toda, o porteiro direcciona-me ao elevador. Todo o prédio em si tem um ar saudável e deslumbrante, desde azulejos reluzentes no chão a paredes forradas com papel nunca antes visto por mim, um tipo de papel com imagens em relevo, sem palavras, parecia o paraíso.
Então chamo o elevador, entro e oiço uma música de elevador que me cativou de tal forma que dou por mi de olhos fechados e a bater o pé, era calma, pacifica, pura e angélica. Penso eu para mim; “Era bem capaz de viver aqui neste elevador”
Entretanto a porta do elevador abre-se e lá estava eu no 5º D e vejo uma porta branca de um lado e uma porta negra do outro. A porta do 5º D era a que estava mais longe.

Chego perto da porta, toco à campainha... Ninguém responde!
Volto a esticar o braço para a tocar á campainha, mas não foi necessário...
Recordo-me de ver a porta abrindo-se devagar, quase em cambra lenta.
Sei que em seguida deixei cair o embrulho no chão, faltou-me o ar nos pulmões, dou dois paços atrás aponto para a porta e...

“Tu? És tu? Marco?” – Disse eu.

O Marco abre a porta, sim o Marco, aquele sábio velho que me encaminhou até aqui, que desabafou as suas agonias e tristezas comigo, estava ali a minha frente.
Trazia vestido no seu corpo velho uma roupa branca, um fato quase de gala.

Foi quando ele me fez sinal com o dedo junto da boca:

“Xiu!” – Disse-me ele como quem pede um segredo.

Fiquei estático, completamente absorto, incrédulo com a situação, senti os olhos completamente abertos e colados a face daquele homem. Subitamente ouço um murmurar vindo daquela boca :

“Apanha o embrulho rápido e entra Diogo!” - Disse ele.

Apanhei o embrulho rapidamente e compus-me.
Ele pôs-me a vontade naquele apartamento gigante...
A primeira visão que tive foi um hall de entrada com um bengaleiro enorme, tinha a forma de uma mulher com umas longas asas e uma faca numa das mãos, senti um choque enorme, uns tremores desde os joelhos até a cabeça, fiquei bastante chocado e impressionado. Senti uma estranha frustração cair em mim.

Foi então que senti uma mão no meu ombro, viro-me e vejo o velho Marco, ele mete a mão debaixo do meu braço e encaminha-me até a sala, ajuda-me a sentar num grande sofá branco. Ele mete uma faca na minha mão e diz:

“Abre o embrulho rápido Diogo! Conseguiste-o recuperar? Conseguiste?”


Ali estava eu, o embrulho apoiado nos meus joelhos e uma faca na mão.
Foi quando eu disse:

“Mas este embrulho não me pertence, eu sou apenas o estafetas... o que é que se passa aqui Marco?”


“Olha o espelho que esta na parede a tua frente, olha-te Diogo!” – Disse-me ele.

Levantei-me e voltei a cair rapidamente com dores bastante fortes na cabeça.
Dou por mim aos gritos pela casa fora a partir tudo que encontrava pela minha frente.
Só me saíam estas palavras pela boca:

“Quero o coração que me roubaram!”
“Quero o coração que me roubaram!”


Foi quando o Marco entra pelo quarto dentro e me dá uns medicamentos.
Sinto-me muito mais calmo... e olho em meu redor, vejo fotos minhas por todo o lado.
Então o Marco diz educadamente:

“Espero que esta sua última saída lhe tenha trazido o que desejava senhor!?”

“Porque me tratas assim Marco” – Disse-lhe eu.

“Porque sou um mero mordomo de sua excelência senhor, quando o senhor Diogo Bettencourt estiver mais em si tudo ficara claro como a água” – Disse ele.

Cai em mim subitamente.

“O trauma que sofreu logo após o roubo do seu coração provocou-lhe esquizofrenia senhor. Mas vamos para a sala rapidamente abrir o embrulho que trouxe e ver o seu conteúdo, espero que seja desta que a estatua que esta no hall de entrada seja queimada desta vez, com a sua permissão, nunca gostei daquela mulher senhor, ela não era para si... vamos acabar com o seu martírio senhor“ – Disse ele.

Sentei-me de novo no sofá branco, agarro na faca e abro o embrulho e...


“Marco não te considero um mero mordomo, considero-te sim um grande amigo que me acompanhou neste processo doloroso, sempre pensaste em mim e acompanhas-me nesta doença que me parece interminável, tu sim mereces tudo de bom nesta vida, sentes as tuas amarguras e tentas curar as minhas, és o ser humano mais bonito que conheço... amo-te como um pai que perdi...

...aqui tens o coração que te roubaram em tempos, és livre Marco!”


“Eu irei continuar a minha busca, escravo de cores e de formas em busca do assobio que move o meu pé! “



Helder Silva copyright 2006


P.S. - pé parado...

Friday, September 15, 2006

“hoje esqueci-me de gostar de ti”

Narrativa que escrevi para uma curta metragem, dei-lhe o nome de:

“hoje esqueci-me de gostar de ti”



...quando dou por mim acordo com as mãos na cara em sobressalto, sinto a cara húmida e pegajosa, os lençóis de seda enrolados na cabeça, um respirar ofegante e compulsivo de quase soluçar em pânico. Levanto-me rapidamente com os olhos esbugalhados e a boca aberta querendo imitir algum som, mas não me saía nada, nenhum tipo de som, nada, apenas um arfar intenso, exausto, gasto como se tivesse andado a correr a noite toda, olho então em redor e penso, “não reconheço isto, onde estou, onde é que estou?”, frio e fraco tento dar um passo em direcção ao nada quando subitamente uma tontura cai sobre mim e caio de novo no sofá. Sinto a cabeça dorida, e uma adrenalina forte que me faz tremer, talvez por ter acordado de tal forma.
Sentado no sofá e a olhar em frente reparo num écran estilhaçado com uma imagem turva por trás que me parece a TV shop, respiro fundo concentro-me e conto até 10 tal como minha mãe me ensinou em criança quando me embalava nos seus braços depois dos pesadelos. Sinto-me melhor, mais calmo, tento olhar de novo em volta, ainda a recuperar da tontura e já reconheço o sitio onde estou...vejo no fundo da sala uma mesa rústica, que comprei numa loja de antiguidades em tempos, sobre a mesa estavam dois copos de cristal e uma garrafa de champanhe que guardava para um momento especial e que estranhamente, não me recordo de a ter aberto, então atordoado esfrego os olhos, ainda húmidos e pegajosos, e continuo a olhar mais em redor e vejo a sala num alvoroço, completamente desarrumada, nada normal em mim.

Olho para mim e vejo a roupa totalmente rasgada... interrogo-me do que se terá passado, mas não consigo pensar, oiço um som desconcertaste que me perturbava o raciocínio, era o vinil do gira-discos que chegara no fim, levanto-me para o desligar, ainda a cambalear tropeço e caio em cima de um corpo que não gemeu com o meu peso da queda... foi então que vi alguém no chão, mesmo ao lado do sofá de onde eu tinha acordado, então pela primeira vez, desde que acordei, consegui soltar um grito da minha boca que estava seca, um grito esquizofrénico de desespero.
Arrasto-me de costas no chão com a ajuda dos cotovelos e dos calcanhares para longe, até bater com as costas na parede... entro em pânico mais uma vez! Dobro as pernas junto do meu peito e apoio a testa nos joelhos, e começo a tremer a soluçar a chorar e a interrogar-me mais ainda...”meu Deus o que se passa aqui?” Não me recordo de nada, absolutamente nada! Lá fora oiço as sirenes da polícia e ambulância.

Não me consegui aproximar do corpo estendido no chão, tinha medo, ainda em agonia sinto as lagrimas do meu choro baterem nas costas da minha mão, estranhamente vejo lagrimas vermelhas, já em terror e preocupado com a situação, sinto um frio assombroso a trepar pela minha coluna até a cabeça, levanto-me e corro freneticamente para a casa de banho, olho-me ao espelho que esta pendurado na parede, meto as mãos na cara e completamente assustado recuo e caio dentro da banheira.

As lagrimas estavam vermelhas de facto, mas vermelhas porque iam limpando o sangue em toda a minha cara até caírem sobre a minha mão. Já não sabia o que fazer, então levanto-me numa luta frenética, ponho-me de pé saio da banheira, saio da casa de banho, corro pela casa fora sem saber para onde vou ao certo... dou por mim a vaguear no mesmo sitio de trás para a frente, de frente para trás, bastante pensativo, quando sou interrompido pela campainha da casa e um bater compulsivo na porta... parei, fiquei quieto na esperança de quem fosse que batia á porta desistisse, enganei-me, a campainha continuava a tocar e a porta a bater e a bater e a bater...e oiço alguém gritar um nome que não o meu... “será engano?” penso eu.
Completamente coberto de receio que percorre o meu corpo e me faz tremer as pernas como canas de bambu ao vento, volto e olho pelo buraco da porta e vejo uma rapariga muito bonita, ela continua a tocar a campainha e a abater compulsivamente na porta, quando vou a perguntar quem é, oiço a voz dela, aquela voz despertou algo em mim, um sentimento estranho, bom, amargo, confortante e indeciso, como se um turbilhão de sentimentos me tivesse atingido, a frase que ela disse não me fazia sentido, mas deixou-me a pensar...

“Quem Ganhou? Quem, Quem, Quem?”

Ali estou eu, sem saber que fazer, com um corpo na minha sala, supostamente morto. Aquela voz dava-me confiança e desconforto ao mesmo tempo, talvez por não conhecer a sua cara. Dava por mim a bater na minha própria cabeça para me abstrair da porta e daquela voz ofegante e inesgotável, as pancadas que eu dava na cabeça funcionavam como um mecanismo de auto concentração enquanto passeava pela sala e ouvia aquela voz a citar a mesma frase vezes sem conta.
Fui até junto do corpo e debrucei-me, mas não lhe consegui tocar, olhei para o sofá onde tinha acordado e vejo um lençol branco, agarrei e tapei a pessoa, quando cubro o corpo reparo no lençol a ensopar-se com sangue, entro em desespero, agarro a pessoa pelos braços e arrasto-a para a casa de banho, lavo a minha cara e grito “já vai, já vai, um minuto” volto a correr para a porta de entrada e abro-a apenas 10 cm sem tirar as correntes, olhei, e ela sem me deixar falar mete as mãos na cara e diz... “Foste Tu!?”

O pânico apoderasse de mim, e com medo do que ela pudesse saber sobre aquele corpo que estava na minha sala, irracionalmente fecho a porta, tiro as correntes de segurança, volto a abrir a porta, e com o braço direito agarro-a violentamente nos colarinhos e puxo-a para dentro de casa e empurro-a contra a parede do hall de entrada, como que se tratasse de um só movimento, e digo-lhe para que não grite.
Meto ambos os braços encostados á parede em torno dela para que não fuja e pergunto-lhe: “Quem és tu?”... Ela em pânico abraça-me e beija-me na boca e diz “gosto tanto de ti, ainda bem que foste tu”, completamente atordoado daquela situação afasto ela de mim e digo: “O que estás a dizer? Ganhei o quê? Quem és tu? Conheces-me de onde? Responde ”Quando ela vai a começar a responder ás minhas questões...oiço baterem de novo á porta e aos gritos: “Policia, abram” entrei em pânico, lembrei-me do corpo na casa de banho escondido, ela aproveitou a situação, baixa-se e foge por baixo dos meus braços e senta-se no sofá. Eu já não sabia o que fazer, baixo os braços a cabeça, dou um suspiro profundo caminho em direcção a porta e numa aceitação interior olho para trás como se o meu mundo irreal e desconhecido tivesse chegado ao fim e entrego-me ao destino.

Abro a porta , meto a cabeça de fora e eles dizem: “boa noite, recebemos noticias de desacatos e tiros neste andar, está tudo bem?” quando vou para responder aparece a rapariga por trás de mim em trajes menores e o cabelo molhado e pede desculpas aos policias pelo incomodo causado, mas que era apenas um filme que estávamos a ver com o volume bastante alto. Os polícias foram-se embora e eu questionei-me porque teria ela feito aquilo. Fecho a porta, olho para ela e sento-me calado e pensativo ao seu lado. Ela olha para mim mete a mão na minha cara e diz mais uma vez:

“Ganhas-te, e eu gosto tanto de ti”Levanto-me rapidamente do sofá, vou até a janela e vejo a chuva a cair na rua enquanto ela se volta a vestir. No meio do silêncio e de costas para ela pergunto-lhe;
“Quem és tu? O que fazes aqui? Porque me ajudaste?” Ela começou a chorar e a gemer... Enervei-me com a situação e mais uma vez com um tom de voz mais agressivo disse: “Responde... Porque?” Quando me viro para olhar para ela, o meu mundo caiu de novo, recuo com medo até esbarrar na mesa que suportava os copos de cristal e o champanhe e caio no chão. Vejo um homem com um lençol branco na mão com manchas de sangue e na outra mão uma pistola apontada á cabeça daquela rapariga que não conhecia. Fiquei sem palavras, sem movimentos, sem reacção alguma, estava incrédulo. O corpo ensanguentado que eu pensava estar morto na casa de banho, estava agora ali a olhar para mim com uma arma apontada a cabeça de outra pessoa.

Mais uma vez o silêncio encarregou-se da situação, e eu não tinha nada para dizer!
Sento-me congelado, indefeso, um animal enjaulado, sem sitio para fugir.
Estivemos ali alguns minutos parados que quase jurava ter sido uma interinidade. Parecia que nos estávamos a estudar uns aos outros, a testar a capacidade de quem quebrava primeiro e soltava as primeiras palavras, afinal de contas não havia nada a fazer, quem estava a tomar conta da situação era o corpo que anteriormente eu julgava morto na minha sala. Levanto-me do chão com os braços no ar, as palmas das mãos á frente do corpo e peço encarecidamente a todos com uma voz tremula: “calma, calma, vamos ter calma, eu não sei o que se passa aqui...”
Ao mencionar tais palavras reparei que quem empunhava a arma teve uma reacção que me assustou bastante, ele franziu as sobrancelhas cerrou os olhos e os dentes, e com o punho compactou o lençol ensanguentado que segurava na mão e lançou-o para a minha cara violentamente, e com os dentes serrados sem abria a boca disse: “cala-te e enrola-o a volta da cabeça dele” eu ainda tentei questionar o porquê, ao qual ele rapidamente tira-lhe a pistola da nuca e empurra-a na minha direcção, ela cai nos meus braços, e pela primeira vez olha para a pessoa que segura a arma e grita:

“Rodrigo és tu? “

Questionei-me interiormente e tal nome não me suscitava nenhum tipo de sentimento. Eu continuava ali, apenas sabia o nome do corpo que pensava estar morto e que a rapariga o conhecia... Senti novamente agitações emocionais dentro da sala, olhares concentrados com muita tensão acumulada. Ela tenta dirigir-se a ele dizendo que tinha saudades e que gostava muito dele, ao qual ele agressivamente respondeu-lhe com uma pancada na testa com o punho da pistola, e diz:

“Sai daqui! Não venhas com lamúria, eu ouvi tudo!”
“Estas satisfeita com este jogo duplo? Era isto que querias?”

Agarra nela com um braço apenas, levanta-a do chão e atira ela de novo para os meus braços dizendo furiosamente:

“enrola o lençol na cabeça dela, já!”



Ela começa a chorar e a soluçar de tanto medo e pede desculpas ao Rodrigo e diz que gosta bastante dele, o seu corpo dava sinais de cansaço e fadiga psicológica.
Não suportou muito tempo, o corpo dela dá de si e cai no chão de joelhos.
Senti que o Rodrigo fraquejou ao ver tais sinais, e começou a lacrimejar também, ele baixa a arma olha para mim e para ela, reparei que ele estava pensativo, reparei também nas lágrimas vermelhas que lhe escorriam pela cara, subitamente, ele muda de feição como se tivesse ido buscar forças ao universo para ultrapassar a situação.
Ele voltou a levantar a arma e apontou para ela e em seguida num gesto rápido apontou-a para mim, foi então que percebi que era altura de dizer algo e aproveitar o momento de fraqueza e sensatez dele e disse-lhe:

“ Rodrigo, tem calma, não sei o que se passa aqui, mas tem calma”

Susana ouviu as minhas palavras e começou a gritar com as mãos na cabeça.
Rodrigo prontamente mandou-nos calar:

“Calem-se!”
“Susana se te oiço gritar mais uma vez meto-te um tiro na cabeça”
“ E a ti já te disse para lhe tapares a cabeça com o lençol ”


Achei melhor acatar as ordens dele, reparei que Susana (finalmente sei o nome dela), estava a sangrar da cabeça devido a pancada que sofreu da pistola. Enrolei o lençol de seda em torno da cabeça dela e senti um deja vu, estranhamente já me tinha deparado com aquela situação de ver o lençol a ficar ensopado com sangue, foi ai que me recordei que o tinha feito ao mesmo corpo que eu pensava estar morto ao lado de um sofá e que naquele momento estava com uma arma apontada a cabeça da Susana.
E eu pensava para mim “meu deus, quem é a Susana, e o que fez ela de tão mal?”
Foi então que olho para os olhos do Rodrigo e senti nitidamente o que ele iria fazer em seguida, vejo ele aproximar-se com a pistola em punho na direcção da Susana com intuito de acabar com a vida dela, num acto heróico inconsciente, fico louco e corro na direcção dele, mas sem efeito, ele deferiu-me um golpe tal que rodopiei e cai de barriga no chão, foi ai então que oiço tais palavras:

“ és bonita até quando choras, e eu não te quero ver a cara “

Subitamente oiço alguém a suster o ar nos pulmões, um tiro na sala, encolho-me com medo e fecho os olhos, sinto um corpo cair no chão, não me recordo se soltei um berro, mas sinto uma agonia enorme que me aperta o coração. Sinto um silencio durante vários segundos, abro os olhos e vejo uma arma ao meu lado, olho para trás e vejo Rodrigo deitado no chão com um buraco na cabeça, não aguentei, sempre tive um estômago fraco e vomitei ali mesmo. Levanto-me tiro o lençol da cabeça da Susana, ela agarra-se a mim e grita o meu nome: “Diogo” e eu digo-lhe: “ já passou, tem calma “ meto as minhas mãos a volta dela, ela apoia a cabeça no meu ombro a chorar, quando subitamente ela solta um grito enorme que me deixou surdo momentaneamente do ouvido direito, olho para trás e vejo outro homem na minha sala com uma arma em punho ainda a fumegar do cano e ainda a apontar para nós.




Instala-se o caos naquela sala, mas eu não oiço nada, parece que o tempo parou ali e fiquei surdo, olho para a Susana e ela tem a boca aberta, parece que esta aos gritos, mas não a oiço. Aparentemente aquele terceiro homem veio do meu quarto e esteve todo o tempo ali perto de nós sem nunca termos dado conta.
O homem aproxima-se de nós com a arma em punho e sem pensar duas vezes dispara a poucos centímetro da minha cabeça, senti aquele tiro como se fosse em mim, o corpo da Susana devido a violência do disparo sai projectado para trás, não tive força para a agarrar em meus braços, ali estava eu coberto de sangue e a dar em louco, quando num ataque de loucura ou até mesmo esquizofrenia, completamente fora de mim, mesmo sem saber quem eu sou ao certo, agarro na arma do Rodrigo e aponto-a ao homem que matou a Susana, fiamos ali os dois em pé, estáticos, de armas apontadas, tal como um duelo, de olhos nos olhos.


Ele decide-se a falar primeiro e pergunta-me.
“Tu não sabes que se passa aqui?” ao qual respondi: “Não”Ele baixou a cabeça, suspirou fundo sem largar a arma que tinha na mão e diz:
“Deves ter perdido a memória devido á pancada que levaste na cabeça?”
“Perdi a memória? Mas como?”... perguntei eu rapidamente.


Foi quando ele me diz que estava a lutar com o Rodrigo na sala, quando eu entro em casa e assustado com a situação, larguei uma mala de viagem e corro para o meu quarto, fui buscar uma arma que guardo por cima do guarda fatos, enquanto eles lutavam, quando volto á sala, escorrego no champanhe que estava derramado no chão e caio, ao cair bato com a cabeça no mármore da lareira que apoiava uma fotografia que ele achou muito estranha e perdi os sentidos. Foi então que me voltei, olho para o topo da lareira, baixo a arma, e caminho na sua direcção de boca aberta, enquanto isto ele continua a explicar a situação:


“eu estava com a susana naquele sofá a beber um pouco de champanhe, estávamos a comemorar a minha promoção na empresa, subitamente batem a porta e a Susana abriu, foi quando o Rodrigo entrou violentamente, empurrou a porta, saca de uma arma que tinha atrás das costas, empurra ela e diz-lhe que ela vai ter que decidir ali com qual dos dois fica, ao que ela diz ser incapaz e pede que lutemos pelo seu amor e sai de casa a correr, era uma luta injusta visto que ele tinha uma arma na mão e eu não, foi então que o Rodrigo se dirige-se a mim com uma arma na mão, e eu de coração acelerado, agarrei a tua arma, disparei, e acertei no peito do Rodrigo que caiu imóvel no chão. Foi então que agarrei em ti deitei-te no sofá, meti o lençol na tua cabeça para estancar o sangue que escorria da tua cabeça e fui-me deitar na tua cama...entretanto fiquei lá e ouvi tudo o que se passou até aqui. Mas não te preocupes... eu já entendi a tua situação também...”






Foi quando ele levanta a cabeça olha para mim com lagrimas nos olhos e diz:

“ também gostava de ter perdido a memória”

Enquanto isto eu continuo a andar na direcção da lareira e olho para a foto, e não quis acreditar no que os meu olhos viam...eu não queria mesmo acreditar no que via;
”Eu a beijar a Susana?”... Oiço um tiro atrás de mim, e uma foto cai a meus pés.
Recordo-me perfeitamente da primeira frase que soltei naquele preciso momento:

- “hoje esqueci-me de gostar de ti”

Hélder Silva

Copyright Outubro 2005

Thursday, August 31, 2006

"Foi até ao Anoitecer"




E assim foi, a "mini" surf trip pela costa vicentina até sagres 350 km de praia.

Tuesday, August 29, 2006

"mini" surf trip


Apresento a minha tenda!
Depois de entrar na boca do "lobo" não há safa!


Foto tirada neste fim de semana na "mini" surf trip que fiz este fim de semana...
Tudo combinado a ultima da hora (adoro cenas assim) agarrar no carro, matérial na tenda e fazer 350 km a procura de praia e boas ondas pela costa vicentina e acabar em Sagres... Acampar por ai ao pé das praias e acordar com o som do mar, meter a cabeça fora da tenda e dizer "isto é vida, deixa-me mas é cá bater uma sacana de tão orgasmico que isto é" ahaha! Depois ir até Portimão curtir um pouco e chegar a casa as 2 da manha de hoje dormir umas 4 horas ir trabalhar e estar aqui a escrever esta bodega com os olhos vermelhos de tão cansado que tou e de ainda sentir o cheiro do sal e da areia entranhado no corpo... my gosh que delicia, quero mais.

Thursday, August 24, 2006

.: drama5ive :.


5 Sentidos, arte, Inverno/outono , Praia, Mar, Trovoada, Chuva, Fogo, Design, Classicos, Monologos, Chá, Torradas, Manteiga de Amendoin, Cobertor, Simples, Complexo, Esquizofrenico, Estrovertido, Timido, Beijos, Escocia, Egipto, HUmm, ON, Off, COMO? QUEM? ONDE? QUANDO?PORQUE?, Point Break, Companhia, Arco-iris, Por e Nascer do Sol, Tu, Eu, Nos, musica, cinema, fotográfia, Coimbra, Porto, Lisboa, Lareira, Calmo, Traquilo, CLICK, cuidado!! QUEM SOU EU???? pergunto isto todos os dias!! E a resposta está no dia de amanha, POR ISSO TENHO QUE VIVER ATE CHEGAR O AMANHA! Ate la Respiro!